O dever do Poder Público de custear medicamentos e tratamentos em falta ou não fornecidos pelo SUS

Inicialmente, deve ser destacado que o direito a saúde é uma garantia constitucional, prevista na Constituição Federal nos artigos 196 a 200, compreendendo-a como direito social e universal, expressamente, nos arts. 6º e 196, abaixo transcritos:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Assim, tem-se que a Constituição Federal dispõe sobre as ações e serviços de saúde como de relevância pública, apresentando as orientações de um sistema único de atendimento que, interpretado conjuntamente com as demais normas constitucionais, leva à conclusão de que o acesso à saúde pública é inicia-se pelo ingresso do paciente no Sistema Único Saúde e que, por meio deste, deve o cidadão receber do Estado todos os meios terapêuticos de que carece.

Tal preceito é complementado pela lei 8.080/90 (lei que instituiu o Sistema Único de Saúde), em seu artigo 2º:

Art. 2º. A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.

Com isso, sendo a saúde um bem social, que deve prestado pelo Estado, muitas vezes quando ausentes medicamentos ou tratamentos no SUS, os pacientes são obrigados a procurarem o Poder Judiciário para fazer valer seu direito constitucional de terem uma intervenção adequada para a enfermidade que o aflige.

Infelizmente, é do conhecimento de todos que o Sistema Único de Saúde enfrenta grave crise, o que leva a uma gama de processos em busca de tratamentos/medicamentos, com isso, surgi um termo cada vez mais comum aos operadores do direito, a chamada judicialização da saúde, que nada mais é do que a denominação utilizada para a busca do cidadão ao Poder Judiciário como a última alternativa para obtenção do medicamento ou tratamento não fornecido ou negado pelo SUS.

No julgamento do pedido de suspensão de tutela antecipada nº 175, formulado pela União, e do pedido de suspensão de tutela antecipada nº 178, formulado pelo Município de Fortaleza, contra acórdão proferido pela 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, nos autos da Apelação Cível no 408729/CE (2006.81.00.003148-1), que deferiu a antecipação de tutela recursal para determinar à União, ao Estado do Ceará e ao Município de Fortaleza, o Ministro Gilmar Mendes destacou:

(…)
“Ressalte-se, ainda, que o alto custo do medicamento não é, por si só, motivo para o seu não fornecimento, visto que a Política de Dispensação de Medicamentos excepcionais visa a contemplar justamente o acesso da população acometida por enfermidades raras aos tratamentos disponíveis”.
(…)

Recentemente, o Supremo Tribunal Federal indeferiu o pedido de Suspensão Liminar 815, onde o município de São Paulo buscava a liberação do dever de fornecer medicamentos a um portador de cirrose hepática, decorrente de contaminação pelo vírus da hepatite C.

O município alegava que existiam terapias alternativas constantes do protocolo de tratamento da Hepatite C prestado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e que o fornecimento de medicamentos de alto custo não aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) representaria risco de lesão à ordem, à saúde e à economia públicas, pois o elevado gasto para o atendimento de um único indivíduo implicaria prejuízos à saúde de toda a população.

Ao indeferir o recurso do município, o ministro destacou que, no caso dos autos, a controvérsia tem inegável repercussão constitucional – garantia dos direitos à vida e à saúde –, pois diz respeito a um cidadão que, diante da impossibilidade financeira de pagar tratamento de saúde por conta própria, busca o custeio de nova terapêutica indisponível na rede pública. Frisou ainda que, na decisão que deferiu o pedido de antecipação de tutela, ficou comprovada a necessidade do fornecimento do medicamento para evitar o agravamento do quadro clínico do paciente.

Em matéria veiculada no jornal Folha de São Paulo em 25.02.2016, é destacado que a falta de medicamentos no Estado de São Paulo atinge 21.500 pessoas.

A referida matéria ainda traz a informação que no Estado do Paraná o atraso é de 4 (quatro) meses para o fornecimento dos medicamentos DACLATASVIR, SOFOSBUVIR e SIMEPREVIR, contudo, não aponta o numero de pacientes que sofrem com o não fornecimento.

Também é destaque no Jornal à ausência de punição para o Ministério da Saúde em caso de falta ou atraso da medicação, concluindo que os pacientes prejudicados devem procurar a justiça (leia mais no link http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2016/02/1743067-saude-atrasa-distribuicao-e-falta-de-remedio-expoe-doente-grave-a-risco.shtml).

Assim, através da singela exposição realizada, podemos concluir que o problema do descaso do Poder Público com aqueles de dele necessitam perdura por anos, e, infelizmente, não apresenta expectativas de uma solução em futuro próximo.

Como operador do direito, busca-se com a presente explanação, informar que o Poder Judiciário vem atuando cada vez mais na medida de suprir a ausência de cuidado do Estado com o cidadão necessitado, fazendo prevalecer a Constituição Federal, garantindo a todos o direito a vida e o acesso à saúde.